30.5.07



Lembras-te da cerejeira à qual trepávamos na Primavera?
Tu escolhias sempre o ramo mais alto, para veres o céu entre a folhagem. Eu, habituada a ser a mais pequena dos dois, ficava nos outros mais perto do chão. E adivinhávamos formas nas nuvens, enquanto estendíamos o braço preguiçosamente para agarrar mais fruta.

Passávamos tardes assim, ao sol, com a desculpa de encher de cerejas a cesta que se destinava às tartes, às compotas, à arca frigorífica no abrigo nuclear para fazer mais tartes e compotas no Inverno. Aquela cerejeira sempre foi generosa connosco, talvez porque gostasse de nos ter deitados, sentados ou enrolados nos seus ramos.

Comíamos até ficarmos com a lingua e os dentes tingidos de vermelho. Fazíamos caretas um ao outro para ver quem era o monstro da árvore. De seguida um concurso de cuspir caroços o mais longe possível, que fazia a gata Punky andar num vai e vem, pensando ser comida para ela o que atirávamos com os lábios em bico e as bochechas cheias de ar.

De noite doía-nos a barriga, mas felizmente a casa tinha dois WC, para onde corríamos à vez, a aliviar as tardes passadas na maior árvore do jardim. Jurávamos nunca mais repetir, mas sempre que ela se cobria de frutos vermelhos e sumarentos lá estávamos nós, e por vezes a gata também nos fazia companhia.

Tenho saudades tuas, das cócegas que me fazias antes de irmos dormir, de inventares histórias nas quais eu acreditava sempre, com os olhos muito abertos, até tu confesares serem mentira. És da minha tribo, estás no pacto de sangue que fizémos na árvore e, tão longe de mim.

Amanhã prometo escrever. Tu sabes que não faço promessas.

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